Espírito de Natal
Lembranças de Natal, algo que me escapa e me fascina. Relembrar esses momentos fixados em fotografias, sob forma e cores, é uma fonte em que bebo para reavivar uma dimensão de um mundo interno, do meu eu no mundo da magia.
Outra forma, são imagens e sensações que ficaram nas várias expressões de uma existência peculiar, e, daí, rever minha relação do nascimento do menino Deus com o fascínio ao velho bondoso e simpático Papai Noel, misturados ao cheiro e gosto de rabanadas, peru, uvas e castanhas cozidas.
Por muitos anos, confesso, prevaleceu o Papai Noel. Não que haja nisto algo de mal, pelo contrário, amei esse velhinho com todo ardor; um amor-paixão egoísta, ao mesmo tempo inocente e crédulo, um amor que vinha do fundo de minha alma e transbordava meu coração de criança. Sua chegada tão esperada tinha o gosto da maçã argentina, tão difícil de encontrar. Muitas vezes, a maçã cortada em quatro, era dividida com meus irmãos, mas Papai Noel, não, eles não sabiam, porém ele era só meu.
Esse amor ideal, de quem não divide o objeto amado e que aos poucos a realidade foi tornando mais distante, transformou-se em minha primeira decepção amorosa. Pedi, então, ao menino do pequeno presépio, onde misturavam-se coisas do céu e da terra, que não fosse verdade, que meu amor não fosse uma mentira; que aquele velhinho da loja fosse o mesmo velhinho do céu.
Senti a dor que só aprendemos através do mundo. A dor inefável de quem quer fugir do vazio ou então, se refugiar em algo maior. Por muito tempo escolhi o nada e Papai Noel morreu dentro de mim. Demorei a me reconciliar com ele e só o acolhi de volta quando acolhi a volta da fantasia que tinge a vida de cores, como o vermelho da roupa de Noel, o verde da árvore de Natal, o azul dos olhos das bonecas, o amarelo dos carrinhos e, também, o branco do sorriso das crianças.
Hoje, impregnado no meu ser há um sereno Papai Noel, ressuscitado, que convive muito bem com o amor ao menino Jesus, numa perfeita alquimia feita de recordações, sonhos e realidade, ao que chamo Espírito de Natal.
Alice Vieira de Moraes- escritora e poetisa
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